Antes de começar a escrever reviews para a internet eu achava que seria uma tarefa fácil. “É só jogar o jogo, escrever o que achou e pronto”. Ledo engano.
Existem alguns desafios no processo de escrever um review. Um deles por exemplo, é decidir o que falar de um jogo remasterizado. Será que eu começo falando da versão original, ou será que eu analiso só as novidades?
Menciono a minha reação quando joguei o original, ou deixo quieto?
Quanto de ênfase eu devo dar pra todas as melhorias gráficas?
Será que vale a pena falar dos novos controles?
Bem, eu diria que cada título exige uma abordagem diferente de review. Afinal de contas, repetir sempre a mesma forma de escrever acabam deixando todos os seus textos monótonos, repetitivos e genéricos.
Contudo, dessa vez eu peço licença ao prezado leitor, pois quero ousar. Quero ir mais longe do que jamais fui e usar meu próprio texto para uma alegoria ao sentimento que tenho pelo título analisado! Vou traduzir a construção da análise com os mesmos elementos que vi no jogo e fazer um trabalho genial! Único! Uma obra-prima!
Sendo assim me resta escrever um texto monótono, repetitivo e genérico. Pois foi exatamente isso que eu senti quando joguei MediEvil.
A primeira vez que vi MediEvil, eu desejei muito ser capaz de tirar todas notas “10” possíveis e imagináveis no meu boletim, só para ter os argumentos necessários para encher o saco dos meus pais até ganhar um Playstation.
O jogo era tudo que um bom título do console tinha que ser: engraçado, dinâmico, desafiador, inovador e engraçadinho. Ok, o último atributo é por minha conta. Mas o que quero dizer é que para os padrões da época, MediEvil era surpreedentemente inovador!
Tudo bem, jovem padawan. Eu entendo que você talvez seja jovem demais para entender a profundidade do que acabo de afirmar. Talvez seja necessário um pouco de contexto para facilitar o entendimento mútuo entre as partes.
Dificilmente teremos uma geração tão expressiva quanto a do primeiro Playstation. Isso por que essa foi a primeira geração onde, literalmente, nos foi apresentada uma nova dimensão. Os jogos que antes apresentavam somente de quatro eixos principais (cima, baixo, esquerda, direita), agora se mostravam totalmente 3D, permitindo que o jogador interagisse de uma maneira totalmente nova e inusitada.
Isso explodiu a cabeça de muita gente! E se o impacto foi enorme para os fãs de games em geral, imagine para os responsáveis por programa tudo isso. Na época, além da dificuldade inerente aos processos de programação, os desenvolvedores precisavam articular maravilhas pra conseguirem fazer algumas coisas funcionarem como deveria. O maior exemplo disso, é a verdadeira “enjambra” que o pessoal da Konami conseguiu fazer ao adicionar a neblina em Silent Hill, já que o console não era capaz de renderizar grandes distâncias e manter uma boa taxa de FPS ao mesmo tempo.
Não era preciso ser um gênio pra entender quais são os pontos altos de MediEvil. Por exemplo: utilizar o companion para sinalizar onde o hit vai acertar dentro do plano do jogo; ou ainda justificar a movimentação esquisita da câmera e do personagem com o fato de que ele é um morto vivo – aliás, ele ser um morto vivo justificava muita coisa; e por fim, o movimento “tanque” de Sir Dan , já que era necessário fazer o game rodar no controle Dual Shock, e no controle original sem os analógicos.
O próprio visual cartunesco do jogo trazia certas vantagens. Graças ao estilo “Tim Burton”, MediEvil conseguia abordar alguns assuntos ousados de maneira simples e descompromissada, já que pelo tom de comédia, era totalmente aceitável ver inimigos surgindo de caixões no meio do nada, além da movimentação desengonçada dos personagens – menção especial a forma como Sir Dan movimenta a espada, que sempre me deu nos nervos.
Enganava-se, no entanto, quem imaginava que MediEvil era um jogo fácil. Muito pelo contrário: dominar os controles já era uma tarefa deveras complicada. Some isso às mecânicas dos chefões – características dos anos 90, e do parco domínio do inglês por grande parte da molecada e pronto! O game acabou se tornando um desafio bastante popular nas locadoras e garantiu espaço na memória e no coração de muita gente que viveu aquela época.
Todas os atalhos justificados pela direção do game para contornar as limitações do console eram ao mesmo tempo, simples e apropriados para um jogo de 1998. Mas será que todas elas envelheceram bem?
Spoiler: não. Mas eu volto nessa parte daqui a pouco.
Quando eu ouvi sobre a remasterização de MediEvil pela primeira vez, confesso que fiquei muito empolgado. A ideia de reviver uma das minhas aventuras preferidas do Playstation – e da possibilidade de finalmente terminar o jogo! Além possibilidade de aproveitar a experiência com gráficos melhorados para a geração atual parecia de fato, muito boa.
Mas como fazer um jogo dos anos 90 funcionar atualmente?
Bem, essa é uma pergunta bem difícil. Não é todo mundo que consegue trazer um clássico de volta a vida (trocadilho não proposital) sem ferir alguns corações. O problema é que o pessoal da Other Ocean parece não ter encontrado a resposta mais adequada para esse problema, tornando o retorno de MediEvil um produto mais esquisito que a própria anatomia do crânio de Sir Daniel Fortesque.
Apesar dos belos gráficos e da uma boa melhoria nos controles, MediEvil falha por ser muito de si mesmo. A maioria dos “atalhos” criados nos anos 90 para contornar as limitações da época foram simplesmente transplantados para os dias de hoje, dando a impressão de que o jogo não é o mesmo de antigamente.
É como rever as clássicas animações computacionais dos anos 90, aquelas que pareciam vir diretamente “do futuro”, hoje em dia. É esquisito. Incomoda. Simplesmente não é natural.
MediEvil é um jogo difícil e sempre será, mas me incomoda ler alguns textos comparando a mecânica do game à uma espécie de protótipo do que viria ser a série Souls. Diferente do que se pode esperar dos games da From Software – que exigem movimentos precisos e coordenados para vencer os inimigos, MediEvil não é o tipo de jogo que preza por oferecer o luxo de controles refinados e certeiros. Comparar os dois jogos é, pelo menos para mim, como comparar Forza com Mario Kart: ambos são divertidos, mas as mecânicas são completamente diferentes.
De toda forma, não se pode atribuir a estranheza percebida ao revistar Gallowmere aos responsáveis pelo remake. Não, de forma alguma. O problema é simples: existem coisas que devem ficar no passado, assim como o próprio Mago Zarok jamais deveria ter retornado com seu plano de dominar o mundo.
A experiência, apesar de tudo, não deixa de ser divertida. Encontrar as armas lendária no Hall dos Heróis e aventurar-se pelos caminhos tortuosos de Gallowmere continua tendo o seu charme, mas ainda assim, é um sentimento apagado, como se observássemos tudo com apenas um olho, tal qual nosso protagonista morto-vivo.
Talvez o maior problema de MediEvil seja a confusão que o game deixa em nossos saudosos corações: teria sido melhor repaginar o game totalmente, ou foi a melhor escolha ter mantido as mecânicas próximas ao que eram originalmente? Provavelmente nunca saberemos a resposta, mas posso afirmar com toda certeza que este é um daqueles jogos que eu preferia ter mantido na memória.
Por fim, pode-se afirmar que a experiência tem pleno potencial de agradar uma parcela dos jogadores. Ainda assim, não ouso dizer que MediEvil justificará seu retorno.
Review elaborado com uma cópia do jogo para PS4 fornecida pela publisher.
Resumo para os preguiçosos
MediEvil é um jogo tão esquisito quanto o crânio de seu protagonista: por ser muito próximo do que era originalmente, dá a impressão de que não é nada similar à versão de 1998. Com um ótimo trabalho realizado na parte gráfica e um leve refinamento nas mecânicas de controle, o jogo mantém muitas de suas mecânicas clássicas o que acaba sendo, ao mesmo tempo, seu maior triunfo e seu maior problema.
Prós
- Recriação precisa da experiência original.
Contras
- Insistência em mecânicas ultrapassadas, sem muito polimento.