Vivemos uma época onde jogos de videogame são lançados toda semana, porém, nem todos valem a pena. Encontrar um jogo que seja capaz de fazer frente à grandes títulos de mundo aberto também não é tarefa fácil, mas Tchia, desenvolvido pela Awaceb, tenta de verdade te oferecer uma experiência inovadora e diferente do que se este acostumado, ao mesmo tempo, em que não te força a nada e praticamente funciona como se estivesse te presenteando com uma bela jornada lúdica.
A história começa com a pequena protagonista ouvindo algo que soa como uma história infantil, mas que infelizmente, no mundo de Tchia, é a mais verdadeira realidade. É contado que o governante da do arquipélago onde o jogo se passa, Meavora, raptou seu pai e o mantém cativo em algum lugar secreto. Tchia decide, então, que cabe a ela resgatar o pai das mãos do tirano governante, custe o que custar.
Também é preciso dizer que o cenário onde o jogo se passa é inspirado na Nova Caledônia, um arquipélago real que fica “próxima” da Austrália e que é a casa do time de desenvolvimento de Tchia. Logo no início do jogo, o time das as caras para agradecer ao jogador por lhes dar a oportunidade de contar a história da pequena aventureira, o que acaba sendo o primeiro sinal de amor deste time pela sua própria obra.
O ponto mais importante de Tchia não é sua mecânica ou visual agradável e marcante. É sua consistência como uma estória belamente construída, que brinca com elementos lúdicos e fantasiosos, ao mesmo tempo, em que lhe permite experienciar uma jornada épica, pelos olhos de uma jovem corajosa e cheia de sonhos.
Tudo em Tchia parece ser forjado na base do amor e da atenção. Cada detalhe do jogo parece conter um pedacinho de quem trabalhou nele e é possível sentir o esmero do time de desenvolvimento em cada diálogo, quest ou desafio que surge pela frente.
Em termos visuais, Tchia é praticamente um livro infanto-juvenil que ganhou vida. Nada é real demais, mas nem por isso os gráficos são feios ou mal feitos. Tudo parece seguir um estilo próprio, que se alterna entre o simples e o sofisticado. Se tivesse que resumir rapidamente os elementos visuais de Tchia, provavelmente utilizaria exatamente estes termos: são simples, mas sofisticados. Só vendo para entender.
Também fica claro nos primeiros minutos de jogo que grande parte das mecânicas de exploração se baseiam em Breath of The Wild, porém, não muito. É como se Tchia pegasse alguns elementos do grande sucesso da Nintendo para construir seus alicerces e, mais tarde, decidisse repaginá-los a suas necessidades. É óbvio que a exploração mais básica consiste em nadar grandes distâncias, subir grandes montanhas e saltar de Paraglider por ai. Tudo muito parecido, mas ainda assim diferente. É como experimentar um prato ao qual você já está acostumado, mas sentir um sabor revigorante de um novo tempero que você não consegue identificar.
Com o tempo, você também perceberá dois elementos interessantes em Tchia. O primeiro é que a menina descobre ser capaz de se transformar em objetos e animais. Por mais útil que seja, o que mais me chamou atenção é que você não tem a necessidade de sair matando tudo que encontra por ai. Ao invés de utilizar seu estilingue para acertar qualquer animal que você encontra pela frente, Tchia oferece uma mecânica em que você pode sair fazendo carinho até mesmo em animais em que geralmente não encostaríamos. Ao mesmo tempo, em que o jogo te permite fazer isso, ele não te obriga nem te julga pelos caminhos que você escolhe. A jornada é sua, os caminhos estão disponíveis, mas você segue por onde quiser.
Os biomas e cenários do jogo também são ricamente construídos. Esteja o jogador na cidade ou no meio de uma floresta de bambu, Tchia é o tipo de jogo em que praticamente todo frame fica bonito graças ao acurado trabalho de direção de arte ao qual foi submetido.
Com biomas tão ricos e interessantes, Tchia também parece saber exatamente o que fazer para que o jogador não se pegue passando em linha reta por todos os cenários, sem nem ao menos olhar para os lados. Diferente da maioria dos jogos por ai, o mapa é um tanto diferente. Quase estático. Para descobrir sua localização, Tchia precisa procurar por monumentos ou locais específicos no mapa, quase como se precisasse triangular as localidades antes de descobrir para onde ir. Falando dessa forma parece algo complicado, mas não é. É apenas uma mecânica que achei bem interessante e que te faz sentir vontade de sempre continuar descobrindo o que tem atrás da montanha a sua frente.
Tchia também usa e abusa de ritmos e músicas para contar sua história e desenvolver sua personagem. Gradualmente o jogador vai sendo introduzido a uma série de mini-games musicais que servem tanto para discorrer o enredo, como para uma espécie de chave para determinados momentos no jogo.
Tocar as músicas do jogo pode mudar o tempo, convocar criaturas, abrir caminhos… ou apenas te fazer sorrir. É mais um daqueles jogos que permitem ao jogador que domina a teoria musical, tirar sons específicos no jogo. Pessoalmente, na maioria das vezes em que me deparei com este tipo de mecânica dentro de um jogo, encarei-as como uma espécie de enchimento desnecessário — uma forma de inflar a quantidade de atividades para que você passe mais tempo jogando. Porém, em Tchia, não senti dessa forma. Mais uma vez, é como experimentar um prato que você já conhece, mas com um tempero diferente e desconhecido.
Talvez o que mais marque em Tchia seja sua qualidade e amor envolvidos. É possível sentir quanto esforço e carinho foi dedicado à cada momento do jogo e acredite ou não, isso faz a diferença. Dá uma sensação esquisita, como se você estivesse consumindo um produto personalizado, único, de qualidade superior. Até as vozes dos personagens são de uma atuação ímpar e fascinante! Já que apesar de todos eles falarem em um idioma desconhecido, é possível sentir a emoção dos personagens à cada sílaba pronunciada.
É muito difícil descrever a experiência de Tchia. São tantas coisas para fazer que é como se o jogo não tivesse uma mecânica principal. Tudo parece diferente e funcionar muito bem junto. É quase como um livro que tomou vida e se desenrola à sua frente, lhe permitindo controlar as decisões da protagonista.
Obviamente o jogo conta com alguns problemas aqui e ali. Bugs na movimentação de Tchia quebram um pouco a experiência e acabam acontecendo mais vezes do que deveriam. No PS5, tive a impressão de que algumas texturas não carregaram corretamente em pontos mais distantes do cenário e pelo menos uma vez o jogo fechou sozinho e me obrigou a reiniciar tudo. Ainda bem que meu save não foi comprometido!
Mas e aí, Tchia vale a pena?
Meu maior desagrado com Tchia é justamente sentir que não tive tempo para experimentar o jogo como deveria. Não é como a maioria dos jogos de mundo aberto atuais onde você sente uma necessidade absurda de vasculhar todos os pontos do mapa para encontrar loots e tesouros únicos. Às vezes eu só queria explorar mesmo. Ver o cenário, descobrir novos lugares. Sinceramente, não sei dizer quanto tempo fazia que não sentia isso.
Tchia é um grande jogo que possivelmente não receberá o reconhecimento merecido. Até mesmo acredito que o game ganhará destaque no futuro, como uma espécie de obra cult de nosso tempo. Foi ótimo ter tido essa experiência tão simples e ao mesmo tempo profunda, e só me resta aguardar que mais obras deste tipo sejam lançadas em breve.
Review elaborado com uma cópia do jogo para PS5 fornecida pela publisher. Jogo disponível para PC, PS4 e PS5.
Resumo para os preguiçosos
Tchia é um jogo lindo e desenvolvido como se fosse um joia preciosa. Cada momento no jogo é simples, porém profundo e pode acabar não sendo tão bem recebido para quem espera algo nos moldes de Breath of The Wild.
É um jogo ambicioso, com uma proposta diferente de exploração e progressão. É como se um tempero diferente fosse adicionar à um prato que você já comeu várias vezes, mas que não consegue identificar qual é.
No fim, se precisasse resumir Tchia em poucas palavras, poderia dizer que o jogo é quase como se fosse um FarCry da Pixar.
Prós
- Conteúdo cativante e enredo envolvente.
- Cenários belíssimos e que parecem se encaixar com cada momento do dia
- Variedade de biomas
- Inúmeras formas de exploração.
Contras
- Pequenos bugs gráficos e de desempenho no PS5.