2017 começou reservando aos fãs de videogames mais uma grande adaptação de um jogo para as telonas. Desta vez, Assassin’s Creed, longa que leva o mesmo nome da série de jogos da Ubisoft, uma das maiores da atualidade. Apostando no tamanho de sua fanbase – assim como Warcraft o fez em 2016 – e no rico universo da franquia, o filme vem com um protagonista original e uma história nunca antes vista nos jogos, e mesmo assim não consegue espantar a famigerada ‘maldição dos filmes baseados em jogos’.
A própria Ubisoft (a divisão Motion Pictures da companhia, pra ser mais exato) foi quem cuidou da produção do filme, colocando ninguém menos do que Michael Fassbender como protagonista e atribuindo a direção à Justin Kurzel, que trabalhara com o ator anteriormente em Macbeth. O roteiro foi escrito por Michael Lesslie, e depois reescrito por Adam Cooper e Bill Collage.
Em Assassin’s Creed somos apresentados a Callum Lynch (Michael Fassbender), um homem que, após a morte de sua mãe, passa anos fugindo da própria dor e acaba preso. Por causa de seus crimes, Callum é executado… Ou quase, já que ele é logo trazido de volta à vida por uma organização chamada Abstergo. O protagonista logo descobre o que a companhia quer dele quando é obrigado a participar do Projeto Animus. O Animus, velho conhecido dos amantes da franquia, é um dispositivo que permite que nos conectemos com as memórias de nossos antepassados, que estão ligados a nós pelo sangue.
O projeto é liderado pela Dra. Sophia Rikkin (Marion Cotillard), que usa Callum e o Animus para acessar as memórias de Aguilar de Nerha (também vivido por Fassbender), um Assassino da Irmandade dos Assassinos que viveu na época da Inquisição Espanhola, no século XV. A Abstergo está atrás de um artefato antigo que os possibilitará erradicar a violência, pelo menos até onde sabemos. Lynch vai descobrindo, parte com o passado, parte com o presente, as reais intenções da organização e qual seu papel dentro disso tudo.
Infelizmente essa descoberta, que segue o clássico modelo de desenvolvimento do herói principal (negação, tentação, aceitação de um chamado maior que ele mesmo), carece de drama ou alguma emoção que faça a história do protagonista ser relevante para o espectador. Falta algum tipo de inspiração para a jornada do personagem, que só aparece no fim do terceiro ato, quando praticamente todo mundo já sabe o que vai acontecer. Parece que o filme leva 140 minutos tentando desenvolver algo onde não há nada para ser desenvolvido, é assim que podemos enxergar a forma que o longa trata Callum Lynch.
O problema também se repete com outros personagens, enquanto alguns recebem tempo mais do que o necessário e não mostram o porquê de estarem ali, outros são subutilizados, como Maria (Ariane Labed), Assassina do Credo e parceira de Aguilar que rouba a cena em todas as cenas de ação que participa, e que é posta de lado para que o protagonista tenha seus momentos de brilho. Sophia Rikkin é a personagem que recebe mais tempo em cena depois de Callum e representa bem como é estar no meio de dois lados tão extremos como os Assassinos e os Templários. Ela e seu pai, Alan Rikkin (Jeremy Irons) possuem ótima sintonia quando compartilham a tela, o que mostra que pelo menos se tratando da escolha do elenco, a Ubisoft não comeu bola.
E falando em comer bola, deve ser destacada o que deve ser a pior falha de Assassin’s Creed: Não dar o devido destaque a Aguilar. Nos jogos estamos acostumados a passar nossa aventura na pele do Assassino, e muito pouco na de seu descendente. O longa opta pelo contrário, mostra apenas os principais acontecimentos na história do Assassino e dá total destaque a Callum Lynch. Isso é inclusive uma das coisas mais frustrantes do filme, já que em diversos momentos o diretor optou por cortar as cenas do passado para cenas de Callum lutando no Animus contra projeções (nós sabemos que seu braço mecânico e projeções são ótimos, mas custa me deixar ver os Assassinos lutando?)
Os poucos momentos empolgantes de Assassin’s Creed são fruto de suas (rápidas) cenas de ação. As lutas são muito bem feitas e as sequências de perseguição bastante divertidas. Fãs de ação terão um prato cheio nesse quesito e se não focarem na história poderão tirar bastante proveito do filme.
Em questão de fan service, Assassin’s Creed também fica em dívida, sendo que se você for ao cinema procurando alguma referência a um personagem ou jogo específico da franquia, sairá decepcionado. Easter eggs estão presentes, é claro, alguns explícitos, outros que você terá que pensar um pouco para entender, mas são muito pouco se considerarmos quantos elementos (e personagens) poderiam aparecer no longa de tantas formas diferentes. O Animus é destaque positivo como exemplo de como adaptar algo do material de origem, mudando o visual em prol da adaptação e mesmo assim sendo aceito pelos fãs. Já o salto da fé é um destaque que poderia ser positivo, mas enrolam tanto para mostrá-lo que quando ele finalmente é realizado nenhuma reação parte do espectador.
Aqueles que não são fãs de Assassin’s Creed ou nunca jogaram um jogo da franquia também ficarão na mão, já que a explicação de algumas coisas que já são conhecidas pelos fãs é inexistente ou simplesmente jogada ao vento. Assassin’s Creed não consegue ficar no meio termo entre fãs e não-fãs e nem entrega algo que seja suficientemente bom para um dos dois lados, fica sempre devendo em algo.
O filme é muito bem situado e o período da Inquisição Espanhola é muito bem recriado, tanto em questão de cenários como de figurinos, o que não se pode dizer das cenas finais que passam o sentimento de “fora de época”. O mundo de Aguilar despertou em mim a vontade de explorar a época através de um jogo, que desse o devido destaque àquele mundo (que me lembrou bastante de Prince of Persia).
E apesar dos pesares, Assassin’s Creed é um sinal positivo para o futuro das adaptações de jogos, assim como Warcraft. Os acertos do filme são justamente onde muitas outras adaptações falharam, e suas falhas parecem mais um erro de direcionamento dos roteiristas do que algo que perseguirá e será mantido em todos os futuros filmes da série. Hoje, não é difícil pensar em um filme baseado em um jogo que seja unanimidade tratando-se de sua qualidade e creio que não demorará muito para um desses aparecer, talvez seja Assassin’s Creed 2 ou Warcraft 2, ou talvez outro longa que, assim como os jogos ao longo da história, aprendeu com os que vieram antes, copiou o que era bom e melhorou tudo de ruim.
Assassin’s Creed estreia nesta quinta-feira (12) em salas espalhadas por todo o território nacional.
Resumo para os preguiçosos
Assassin’s Creed segue uma história original, se apoiando em apenas alguns elementos base da franquia de jogos da Ubisoft. Conta com um bom elenco, ótimas cenas de ação e cenários e figurinos maravilhosamente recriados, mas falha tanto na relevância da história num todo para o universo quanto do personagem para quem está assistindo. Também não consegue entregar uma experiência ideal para quem é fã ou para quem não jogou nenhum jogo da franquia, terminando devendo em ambos os lados. É um filme para fãs de ação que queiram ver algo sem muita expectativa e fãs dos jogos que não estejam esperando fan service e easter eggs a cada salto na palha.
Prós
- Boa escolha de elenco
- Ação reserva os poucos momentos empolgantes
- Período da Inquisição Espanhola muito bem recriado
Contras
- Personagens mal aproveitados
- Desenvolvimento do protagonista carece de drama
- Fica devendo em easter eggs e fan service
- Fica devendo na explicação de elementos para não-fãs
- Filme termina sendo pouco relevante para a franquia