Embora tenha sido criada pela Don’t Nod, a série Life is Strange já pode ser considerada há tempos como um trabalho próprio da Deck Nine, que, com Double Exposure, chega a seu terceiro jogo narrativo envolvendo super poderes. Nele, a empresa se mostra ousada ao voltar a dar protagonismo a Max Caulfield, uma personagem muito querida entre os fãs.
Anos depois dos eventos do primeiro jogo da franquia, ela se estabeleceu como uma fotógrafa famosa, mas que nunca para em um lugar por muito tempo. Quando isso finalmente acontece e a personagem parece ter encontrado uma nova casa, os acontecimentos de Arcadia Bay voltam à tona quando uma nova tragédia afeta sua vida.
Logo no começo de Life is Strange: Double Exposure, a protagonista vê Safi, sua nova melhor amiga, sendo morta de maneira misteriosa. Isso faz com que Max descubra ter a capacidade de viajar entre realidades, sendo que em uma delas sua companheira ainda está viva. No entanto, há sinais claros de que ela ainda corre perigo, o que inicia uma corrida contra o tempo para descobrir o verdadeiro responsável.
Life is Strange: Double Exposure segue estrutura da série
Assim como nos episódios anteriores da franquia, o novo trabalho da Deck Nine é uma narrativa interativa na qual não há muita ação. A aventura é estruturada por momentos em que exploramos ambientes em buscas de pistas, conversamos com outros personagens e descobrimos alguns elementos interativos.
Em pontos-chave da trama, é possível escolher diálogos que mudam como outras figuras nos veem, o que pode fazer com que a narrativa tome caminhos inesperados. O diferencial de Life is Strange: Double Exposure fica pelo fato de que, ao navegar por duas dimensões paralelas, conseguimos ter um conhecimento mais amplo de muitas pessoas.
Um recepcionista, por exemplo, pode adorar Max na dimensão em que Safi morreu, se tornando seu confidente íntimo. Já na outra, os personagens podem acabar se estranhando, o que gera uma dinâmica totalmente diferente. Em muitos casos da trama, avançar significa saber lidar com as duas versões diferentes de uma pessoa, as manipulando de forma a atingir um objetivo.
Os acertos do game vem justamente quando ele consegue transformar essas interações em verdadeiros quebra-cabeças, que brincam com a capacidade do jogador de lembrar as regras de cada dimensões. Embora muitos resultados sejam previsíveis, é interessante ver como conseguimos nos aproximar de certos personagens e nos sentimos até mesmo um pouco culpados quando precisamos confrontar algumas de suas versões.
Infelizmente, a inconsistência de algumas figuras importantes acaba sendo um incômodo quanto mais nos aprofundamos na aventura. Ao jogarmos de uma só vez os cinco capítulos de Life is Strange: Double Exposure, fica fácil perceber o quanto algumas linhas narrativas são cortadas de forma súbita, e rumos que pareciam interessantes são abandonados sem grande cerimônia.
Um exemplo que ilustra bem isso acontece logo no primeiro capítulo. Nele, podemos ajudar um estudante a solucionar uma caixa que também é um quebra-cabeça, abrindo a primeira de suas muitas camadas. Enquanto o jogo dá a entender que esse é um elemento que vai reaparecer no futuro, o objeto é esquecido e nunca mais temos a oportunidade de nos aprofundar em seu mistério.
Essa inconsistência, infelizmente, também acaba afetando a narrativa central. Não vamos entrar em spoilers, já que a narrativa é o que guia Life is Strange: Double Exposure, mas a relação da protagonista com o vilão principal é frustrante. Enquanto a Deck Nine sabe construir tensões e reviravoltas, parece que ela perdeu fôlego na hora de definir o final de sua trama.
O mais frustrante não é necessariamente como as coisas acabam, mas sim a sensação de que nossas escolhas não importam muito. Embora alguns diálogos indiquem que a narrativa pode seguir certo caminho, na prática isso não passa de uma ilusão e o game parece ter um caminho muito pré-determinado — algo bem chato quando ele faz você acreditar que outra opção é viável.
Problemas notáveis
Além da narrativa ter um desfecho que parece mais decepcionante quanto mais se pensa nela, Life is Strange: Double Exposure também é marcado por alguns problemas técnicos pontuais, mas notáveis. Em um momento, por exemplo, precisei navegar entre dimensões para abrir uma maleta que, curiosamente, já aparecia aberta quando me aproximava dela.
Já em outro, o jogo começou a perder suas faixas sonoras aos poucos, até chegar ao ponto de ficar totalmente mudo. O problema se resolveu quando fechamos e reabrimos o game no PlayStation 5, mas isso exigiu ter que refazer alguns trechos da aventura, o que não é exatamente legal.
No entanto, o maior problema do game é realmente sua inconsistência. Elementos são apresentados em um episódio, somente para serem esquecidos no outro, e nunca fica claro o motivo pelo qual os poderes de Max se transformaram. A impressão que fica, infelizmente, é a de que as soluções do roteiro se preocupam mais em fazer com que ele ande de alguma forma, do que em apresentar elementos de um mundo coerente e que respeite o passado da série.
Vale a pena?
É complicado fazer um review de um jogo como Life is Strange: Double Exposure, dado seu caráter essencialmente narrativo. Afinal, explicar porque um ou outro trecho narrativo funciona ou não geralmente está associado a poder entrar em detalhes sobre ele, o que acabaria tornando falha a tentativa de fazer uma análise com o mínimo de spoilers.
Ainda assim, devo dizer que sai um pouco decepcionado com o trabalho da Deck Nine, especialmente depois de o estúdio entregar um bom trabalho com True Colors. Enquanto a nova história tem momentos bons e personagens marcantes, ela peca demais pela inconsistência e por trazer uma reviravolta final decepcionante.
O lado positivo sem dúvida é a volta de Max, e a coragem do estúdio de colocar na mesa os eventos de Arcadia Bay e mostrar que a personagem os superou. No entanto, os elementos que não são derivados do que a Don’t Nod estabeleceu no passado parecem mal resolvidos, e se beneficiariam muito de uma revisão geral de roteiro. Caso você seja um fã da franquia, ainda há alguns elementos que se salvam, como os personagens, mas você pode chegar ao final da trama sentindo que coisas importantes acabaram faltando.
Jogamos Life is Strange: Double Exposure no PlayStation 5 com uma chave fornecida pela Square Enix.
Resumo para os preguiçosos
Life is Strange: Double Exposure ganha pontos por saber explorar bem a protagonista Max Caufield, que não se esqueceu dos traumas que viveu em Arcadia Bay. No entanto, conceitos mal explorados e uma narrativa que nem sempre respeita as decisões do jogador estragam uma experiência que poderia ser bem mais satisfatória.
Prós
- A volta de Max Caulfield
- Tem bons personagens secundários
- A mecânica de navegar entre dimensões geralmente funciona bem
- Ótima trilha sonora
Contras
- Nem sempre respeita as decisões do jogador
- Elementos narrativos mal explorados
- Conclusão decepcionante