O premiado filme Anora, de Sean Baker, estreou nos cinemas brasileiros em janeiro de 2025 e já havia sido disponibilizado em alguns serviços de streaming nos meses seguintes. Mas só agora, nesta quarta-feira (23), o longa chegou ao Prime Video, tornando-se acessível a um público ainda mais amplo. Vencedor da Palma de Ouro em Cannes e grande destaque no Oscar 2025, onde conquistou cinco estatuetas, incluindo Melhor Atriz para Mikey Madison, Anora mistura conto de fadas, comédia romântica e crítica social — tudo isso culminando em um final ambíguo que continua gerando debates. A seguir, destrinchamos os principais significados por trás das cenas finais.
Quem é Anora, afinal?
A personagem-título é Ani, uma jovem stripper e acompanhante que vive em Brighton Beach, bairro nova-iorquino com forte presença de imigrantes russos. Ao conhecer Vanya, filho de um oligarca russo, Ani se vê arrastada para um mundo de luxo, festas e excessos. O relacionamento entre os dois avança de forma impulsiva até o casamento, um gesto que, para ele, resolve seu problema com o visto, e para ela, parece ser a chance de uma vida melhor. Mas o que inicialmente soa como uma comédia romântica improvável logo se transforma em um retrato cruel da desigualdade e da fragilidade emocional dos envolvidos.
O conto de fadas desmorona
A chegada da família de Vanya aos Estados Unidos marca a virada do filme. Indignados com o casamento, os pais do rapaz enviam capangas — entre eles Igor (Yura Borisov), encarregado de garantir a anulação da união. Vanya, imaturo e covarde, abandona Ani, que passa a ser pressionada para aceitar o fim do matrimônio. Mesmo diante de ameaças e suborno, ela resiste, acreditando que ainda há amor. Quando, enfim, a anulação acontece em Las Vegas, Ani começa a encarar a verdade: Vanya jamais a amou, e seu sonho romântico não passa de um reflexo da desigualdade social em que vive.
Igor e Ani: romance ou solidariedade?
Igor, inicialmente um dos agentes da humilhação de Ani, passa a agir de forma mais gentil. Ele é o único que demonstra empatia e respeito por ela, apesar de seu papel dúbio na trama. Eles passam uma noite juntos na mansão da família de Vanya, e no dia seguinte, ele a leva de volta para casa, devolvendo-lhe o anel de casamento que haviam tomado. É nesse momento que Ani toma a iniciativa de fazer sexo com ele no carro. Mas o gesto, longe de representar um desfecho romântico, é carregado de ambiguidade.
Quando Igor tenta beijá-la, Ani recua, agride-o brevemente e começa a chorar. O contraste entre o início e o fim do filme é evidente: da iluminação pulsante do clube de strip à neve silenciosa que cobre o carro, tudo aponta para um ciclo que se fecha sem nenhuma verdadeira transformação em sua vida.
Por que Ani chora no final?
A cena final, em que Ani desaba nos braços de Igor, sintetiza toda a complexidade emocional do filme. Sua vulnerabilidade emerge não por uma reconciliação amorosa, mas por tudo que ela perdeu — ou melhor, por tudo que ela nunca teve. Ela foi usada por Vanya, descartada por seus pais, pressionada por homens que a trataram como mercadoria. Mesmo a gentileza de Igor é, em parte, um resquício do sistema de opressão que os cerca. A relação entre eles não é baseada em amor, mas em uma espécie de reconhecimento mútuo como peças descartáveis dentro de uma engrenagem dominada pelos ultrarricos.
Ani chora porque compreende que seu sonho de ascensão social era ilusório. O anel devolvido por Igor representa não um gesto romântico, mas a confirmação de que tudo foi, desde o início, uma transação. Seu choro é, portanto, um luto silencioso pelo que poderia ter sido, mas jamais foi.
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